domingo, 20 de dezembro de 2015

Satélite europeu disponibiliza imagens da Terra para todos

O Sentinel-2a, novo satélite de observação da União Europeia, entrou em operação. Usuários podem agora, mediante um registro simples na internet, baixar qualquer imagem do planeta.
O satélite, que estava em teste desde seu lançamento, em junho, registra imagens da superfície em luz comum e infravermelha.
Suas imagens serão usadas por pesquisadores para acompanhar uma série de situações, do crescimento das megalópoles ao desenvolvimento das principais culturas de alimentos do mundo. Outro emprego promissor será em estudos climáticos.
A política de dados abertos da União Europeia permite que qualquer pessoa possa baixar e manipular as imagens do Sentinel.
E diferentemente de registros de satélites especializados, que são de difícil interpretação, as imagens coloridas do Sentinel-2a são simples.
A Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês), que controla o satélite, espera uma grande demanda pelas imagens.
Milhares de pessoas já se registraram para fazer downloads do Sentinel – a maioria estava interessada nos registros mais complexos de radar produzidos por outro equipamento da mesma família, o Sentinel-1a.
“Esperamos que a procura por dados do Sentinel supere todos os precedentes. Já está sendo algo nunca visto. Nunca tivemos tantos downloads”, afirmou Volker Liebig, diretor de Observação da Terra na ESA.
“É difícil estimar qual será a demanda para o Sentinel-2a, mas certamente será em petabytes.” Um petabyte equivale a aproximadamente a 200 mil DVDs.
Imagens óticas (basicamente aquelas que podemos ver) são a pedra fundamental da observação da Terra, e aparecem cada vez mais em aplicativos móveis e na internet.
Um grande sucesso nessa área é a série do programa americano Landsat, que há mais de 40 anos fornece um registro contínuo das mudanças do planeta.
O Sentinel-2a terá um papel complementar ao Landsat, mas com maior capacidade – o que explica a estimativa de alta procura pelas imagens.
Os instrumentos do 2a são sensíveis a um maior número de espectros de luz, permitindo o discernimento de mais informações sobre a superfície. Também irão cobrir uma faixa maior de solo (290 km contra 185 km no Landsat). Suas imagens coloridas possuem ainda uma resolução de dez metros, contra 30 metros do sistema americano.
O Sentinel-2a ainda não opera em plena capacidade, mas especialistas avaliam que os primeiros registros já cumprem as expectativas de qualidade.
Bianca Hoersch, da ESA, diz que ajustes de qualidade estão em curso, e que o download de um registro de 5 GB deverá demorar menos de dez minutos.
Quem planeja baixar imagens do satélite deverá ter memória suficiente no computador, pois os arquivos são pesados.
O próximo satélite da família Sentinel a ser lançado dentro do bilionário programa Copernicus da União Europeia é o 3a. O foco desse equipamento, que deverá ser lançado no próximo mês, será os oceanos. (Fonte: G1)

FSC Internacional suspense certificação da Jari, correspondente ao maior plano de manejo florestal do mundo

O plano da Empresa Jari tem 545.000 hectares, e fica na fronteira do Pará com o Amapá.
A FSC (certificação ambiental) Internacional suspendeu certificação da Empresa Jari Florestal. Denúncias de envolvimento em lavagem de créditos florestais, queixas trabalhistas e de violência contra as comunidades tradicionais, onde ela opera pesaram em favor da suspensão da principal certificação ambiental do mundo. O plano aprovado este ano tinha validade até 2019.

Exploração de madeira na região do Jari. R. Almeida\2015.

A medida foi publica no começo do mês no site do FSC Internacional. O Selo Verde, como é conhecida a sigla FSC – Forest Stewardship Council – (Conselho de Manejo Florestal, em português).  Leia AQUI
A assessoria do FSC Brasil confirma a informação, e esclarece que a chancela foi suspensa para a exploração de madeira nativa.
A empresa não conta mais com assessoria de imprensa. Todos os e-mails enviadas solicitando informações sobre o assunto retornaram. No telefone de contato com a imprensa, agora funciona como institucional. A pessoa que atende não sabe informar quem poderia esclarecer sobre a suspensão da certificação.
A Sysflor, empresa que certificou o plano da Jari, não atende ligações. Até o momento não houve resposta do email enviado solicitando informações.
A Jari
A presença da Jari na Amazônia data de tempos ditatoriais.  O multimilionário estadunidense Daniel Ludwig foi o beneficiário dos financiamentos públicos para um complexo agroindustrial que desmatou mais de 200 mil hectares de floresta densa. O Grupo paulista Orsa é quem controla o empreendimento atualmente.
A situação na área de monocultivo de eucalipto continua tensa. Leia AQUI.
Reportagem investigativa publicada no site da Agência Pública faz um profundo mergulho na história da empresa na Amazônia. Leia AQUI

Matéria do Blogue Furo, de Rogério Almeida

Seca ameaça a Amazônia

Experimento feito na maior floresta tropical do mundo mostra colapso de árvores com ressecamento do solo
MARIA GUIMARÃES | ED. 238 | DEZEMBRO 2015


© RAFAEL OLIVEIRA/UNICAMP
Do alto de uma torre de 40 metros, fica visível a mortalidade das árvores maiores,  destacadas acima do dossel
Do alto de uma torre de 40 metros, fica visível a mortalidade das árvores maiores, destacadas acima do dossel
Ao tomar suco por um canudo é preciso cuidado para manter o tubo bem imerso. Do contrário, bolhas de ar se formam e rompem a estrutura do fio líquido que leva a bebida do copo à boca. Aumente a escala para a altura de um prédio de 10 andares e pode imaginar o fluxo de água dentro de uma das gigantescas árvores amazônicas. A transpiração pelas folhas dá origem à sucção que movimenta a água desde as raízes até as imensas copas das árvores, que podem ultrapassar os 40 metros de altura, e lança para a atmosfera uma umidade responsável por entre 35% e 50% das chuvas na região, com impacto importante na hidrologia global. Quando esse sistema falha, o ciclo da água não é o único afetado. As árvores, que até então pareciam funcionar normalmente, subitamente morrem. Um experimento liderado pelo ecólogo inglês Patrick Meir, da Universidade de Edimburgo, na Escócia, e da Universidade Nacional da Austrália, provocou 15 anos de seca numa parcela amazônica e revelou o papel desse mecanismo, de acordo com artigo publicado em novembro na revista Nature.
Para construir o experimento foram necessários 500 metros cúbicos (m3) de madeira, 5 toneladas de plástico, 2 toneladas de pregos e 23 mil horas-homem (10 homens trabalhando de segunda a segunda por um ano), de acordo com o meteorologista Antonio Carlos Lola da Costa, da Universidade Federal do Pará (UFPA). O resultado são 6 mil painéis de plástico que medem 3 metros (m) por 0,5 m cada um, entremeados por 18 calhas com 100 m de comprimento responsáveis por impedir que 50% da chuva que cai chegue ao solo numa parcela de  1 hectare na Floresta Nacional de Caxiuanã, no norte do Pará, onde o Museu Paraense Emílio Goeldi mantém uma estação científica. “O Patrick me procurou em 1999 com essa ideia maluca”, conta Lola. O meteorologista não sabia por onde começar, mas estudou as fotos que Meir lhe mandou de um experimento similar, o Seca Floresta, que estava sendo montado na Floresta Nacional do Tapajós, no oeste do estado, e saiu a campo. “Em um ano estava feito.” Não era um feito logístico trivial. Chegar a Caxiuanã envolve sair de Belém e passar 12 horas a bordo de um barco repleto de redes coloridas apinhadas, até Breves. Foi nessa cidade de cerca de 100 mil habitantes que Lola conseguiu o material para sua empreitada, como os tubos de ferro galvanizado para montar duas torres com 40 m de altura. De lá, 10 horas em um barco menor levam a Caxiuanã, onde o material precisou ser carregado pelo meio da densa floresta.
O experimento conhecido como Esecaflor, abreviação de Efeitos da Seca da Floresta, é o mais extenso e mais duradouro no mundo a avaliar o efeito de seca numa floresta tropical. O único comparável é o Seca Floresta, que abrangeu uma área similar e foi encerrado após cinco anos (ver Pesquisa FAPESP nº 156). Nesta última década e meia, Antonio Carlos Lola tem sido o principal responsável por monitorar a reação da floresta e manter o experimento de pé mesmo quando ele é constantemente derrubado por galhos e árvores que caem, uma empreitada que exige entre R$ 10 mil e R$ 15 mil por mês. Um valor que tende a subir, agora que mais árvores têm sucumbido à seca, destruindo parte da estrutura. “Passo por volta de seis meses do ano no meio do mato, com interrupções”, conta ele, que tem coordenado uma série de projetos de alunos de mestrado e doutorado no âmbito do experimento.
016-021_Amazonia_238
Observação prolongada
Em linhas gerais os resultados dos dois experimentos amazônicos contam histórias semelhantes, como mostra artigo de revisão publicado por Meir e colegas em setembro na revista BioScience: nos primeiros anos a floresta parece ignorar a falta de chuva e mantém o funcionamento normal. Passados alguns anos de seca, porém, galhos começam a cair e árvores a morrer, sobretudo as mais altas e as menores. Experimentos em outros países analisaram uma área menor ou duraram menos tempo – o maior, na Indonésia, funcionou por dois anos.
© PAULO BRANDO / IPAM
Fogo experimental no Mato Grosso: em condições normais de umidade, os incêndios têm baixa energia e são pouco destrutivos
Fogo experimental no Mato Grosso: em condições normais de umidade, os incêndios têm baixa energia e são pouco destrutivos
O estudo de Caxiuanã traz resultados inéditos por sua longa duração: o colapso das maiores árvores só aconteceu após 13 anos da seca experimental e pode representar um ponto de inflexão em que a floresta muda de cara. Desde 2001 os pesquisadores vêm fazendo medições fisiológicas nas árvores, comparando a área com restrição de chuva e uma parcela semelhante sem intervenção. Nos últimos dois anos, começaram a registrar uma mortalidade drástica entre as árvores mais altas, raras por natureza, que caem causando destruição e transformando a floresta pujante numa mata de aparência degradada. “Das 12 árvores mais altas com diâmetro maior que 60 centímetros, restam apenas três”, conta Lucy Rowland, pesquisadora britânica em estágio de pós-doutorado no grupo de Meir na Universidade de Edimburgo que está à frente do projeto desde 2011. A surpresa foi identificar no sistema hidráulico a causa interna dessa mortalidade. Quando o suprimento de água no solo é reduzido, aumenta a tensão na coluna d’água no interior dos vasos condutores das árvores, o xilema. A integridade dessa coluna, que depende da adesão natural entre as moléculas de água, acaba comprometida por bolhas de ar, um processo que os especialistas chamam de cavitação. A consequência desse colapso, que acontece de repente, é a incapacidade de levar água das raízes às folhas e a morte súbita da árvore. Meir ressalta que essa falha hidráulica funciona como um gatilho que inicia o processo de morte, sem ser necessariamente a causa final – ainda desconhecida.
Outra hipótese favorecida para explicar a morte de árvores em situações de seca é o que os pesquisadores chamam de “fome de carbono”. Quando as folhas fecham os estômatos (poros que permitem transpiração e trocas gasosas) para evitar o ressecamento, também reduzem a absorção de carbono. O mais provável é que os dois processos aconteçam simultaneamente, mas no caso de Caxiuanã os pesquisadores descartaram a falta de carbono como fator principal ao verificar que as árvores continham um suprimento normal desse elemento e não pararam de crescer até a morte.
“Medimos a vulnerabilidade do sistema hidráulico das plantas à cavitação e vimos que ela tem relação com o diâmetro da árvore”, conta o biólogo Rafael Oliveira, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), colaborador do projeto há dois anos. A observação condiz com a preponderância de vítimas avantajadas: 15 árvores com diâmetro maior que 40 centímetros caíram na área experimental, em comparação com apenas uma ou duas na zona de controle, onde não há exclusão de chuva. O impacto é grande, porque essas árvores gigantescas concentram uma parcela importante da biomassa da floresta e do dossel emissor de umidade. Enquanto isso, as de tamanho médio estão crescendo até mais, graças à luz que chega até elas agora que a mata vai se tornando esparsa e cheia de frestas entre as copas.
© RAFAEL OLIVEIRA / UNICAMP
Painéis de plástico impedem que metade da chuva chegue ao chão...
Painéis de plástico impedem que metade da chuva chegue ao chão…
Oliveira tem estudado as relações entre o solo, as plantas e a atmosfera, e em uma revisão publicada em 2014 na revistaTheoretical and Experimental Plant Physiology mostrou que mudanças no regime de precipitação podem causar um estresse hídrico letal por cavitação, mesmo que a seca seja compensada por um período de chuvas intensas, de maneira que o total anual de chuvas não se altere. Para ele, é preciso entender melhor o funcionamento fisiológico e anatômico das árvores nessas condições para prever sua reação às mudanças previstas no clima. Essas particularidades também devem explicar por que a reação varia entre espécies. O estudo de Caxiuanã, por exemplo, aponta o gênero Pouteria como muito vulnerável à seca e o Licania como o mais resistente, entre as árvores examinadas. Os mecanismos usados pelas plantas são diversos, como absorver água pela parte aérea – pelas folhas e até pelos ramos e tronco. “Precisamos ver quais árvores na Amazônia fazem isso”, planeja.
Outro efeito da mortalidade das árvores é o acúmulo de mais folhas e galhos no solo da floresta. “Quem trabalha com fogo chama essa camada de combustível”, brinca o ecólogo Paulo Brando, pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e do Centro de Pesquisa Woods Hole, Estados Unidos. Um dos integrantes do Seca Floresta, cujo imenso banco de dados ainda está em análise quase 10 anos depois de encerrado o projeto, ele mais recentemente conduziu um estudo com incêndios florestais num experimento no Alto Xingu, a região mais seca da Amazônia. Segundo os resultados apresentados em artigo de 2014 na PNAS, as árvores resistiram bem à primeira queimada, em 2004, em parte porque a própria umidade da floresta impediu que o fogo atingisse proporções devastadoras. O resultado marcante veio em 2007, quando o incêndio programado coincidiu com uma seca acentuada e representou, na interpretação dos autores, um ponto de inflexão na floresta. “O que vimos foi fogo de grande intensidade que matou tudo, principalmente as árvores pequenas”, conta, concluindo que a interação entre seca e fogo potencializa as forças motrizes de degradação. Menos água no solo, menos umidade no ar e mais combustível no chão agem em conjunto e aumentam muito a probabilidade de fogo. E não se pode esquecer a ação humana nas fronteiras agrícolas, onde o fogo é comum para manejo e se soma aos efeitos do desmatamento, que criam ilhas de floresta com bordas vulneráveis. “A fronteira da floresta com uma plantação de soja, por exemplo, é 5 graus Celsius mais quente do que o interior da floresta, e mais seca”, diz Brando.
© RAFAEL OLIVEIRA / UNICAMP
...provocando queda de árvores...
…provocando queda de árvores…
Ele é coautor de um estudo feito pela geógrafa Ane Alencar, também do Ipam, que analisou registros de incêndios na Amazônia, por imagens de satélite, entre 1983 e 2007. Os resultados, publicados em setembro na Ecological Applications, mostram que já houve um aumento na ocorrência de fogo florestal em resposta a um clima mais seco. Comparando três tipos de mata no leste da Amazônia, o grupo verificou que a floresta densa é sensível a mudanças climáticas, enquanto as formações aberta e de transição estão mais sujeitas à ação humana por desmatamento.
Futuro
Como não há bola de cristal para enxergar o que vem à frente, vários grupos buscam desenvolver modelos climáticos e ecológicos. Brando participou de um estudo liderado por Philip Duffy, do Woods Hole, que comparou a capacidade de modelos climáticos acomodarem as secas que aconteceram em 2005 e 2010 na Amazônia, tão drásticas que não era esperado que se repetissem num período menor do que um século. Os resultados, publicados em outubro no site da PNAS, preveem um aumento significativo de secas, com um crescimento da área afetada por essas secas na região amazônica. O problema, segundo Brando, é que boa parte dos modelos lida com médias, e o que está em questão são extremos climáticos. Este ano, caracterizado por um fenômeno El Niño mais forte do que a média, a equipe do Esecaflor encontrou, em novembro, uma floresta praticamente sem chuva havia mais de dois meses. A expectativa é, nos próximos anos, acompanhar as consequências desse período.
© RAFAEL OLIVEIRA / UNICAMP
...calhas levam a água embora numa área de 1 hectare da Floresta Nacional de Caxiuanã
…calhas levam a água embora numa área de 1 hectare da Floresta Nacional de Caxiuanã
“O relatório de 2013 do IPCC ressaltou nossa falta de capacidade em prever a mortalidade relacionada à seca nas florestas como uma das incertezas na ciência ligada à vegetação e ao clima”, conta Meir. “Nossos resultados indicam qual mecanismo fisiológico precisa ser bem representado pelos modelos para prever a mortalidade das árvores”, explica. Nessa busca por reduzir incertezas e antecipar o futuro, Lucy – que é especialista em usar dados de campo para alimentar modelos – vem trabalhando em parceria com o grupo de Stephen Sitch, na Universidade de Exeter, na Inglaterra, para aprimorar a representação das respostas das florestas tropicais à seca no modelo de vegetação conhecido como Jules. A Amazônia fala claramente sobre a importância de políticas que busquem reduzir as mudanças climáticas, tema que inundou as notícias nos últimos tempos por causa da Conferência do Clima em Paris (COP21), que ocorreu este mês. Os experimentos mostram efeitos localizados, mas secas naturais como as da década passada podem afetar uma área extensa da floresta. Meir ressalta a necessidade de quebrar o ciclo: ao se decomporem, imensas árvores mortas liberam na atmosfera uma quantidade de carbono que tende a agravar o efeito estufa. “É possível desenvolver regras de energia e uso da terra que sejam economicamente benéficas, sem danificar o ambiente no longo prazo”, completa.

Projeto
Interações entre solo-vegetação-atmosfera em uma paisagem tropical em transformação (n° 2011/52072-0); Modalidade Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (Pite) e Acordo FAPESP-Microsoft Research; Pesquisador responsável Rafael Silva Oliveira (IB-Unicamp); Investimento R$ 1.082.525,94.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Senadores votam futuro do Licenciamento Ambiental

Projeto que aumenta o risco de impactos e desastres ambientais pode ser votado no plenário do Senado essa semana; texto tramita em regime de urgência.
Um projeto que pretende fragilizar o principal instrumento de prevenção contra desastres e impactos ambientais pode ser votado a qualquer momento no plenário do Senado. Trata-se do Projeto de Lei do Senado (PLS) 654/2015, que cria um “rito sumário”, curtíssimo, com cerca de oito meses, para o licenciamento ambiental de empreendimentos de infraestrutura que sejam classificados como “estratégicos” pelo governo.
No desastre de Mariana (MG), segundo o Ministério Público de Minas Gerais, o licenciamento ambiental foi descumprido sem que tivesse havido fiscalização efetiva pelo órgão ambiental responsável. As condicionantes impostas pelo licenciamento, como a execução de um plano para emergências, foram desconsideradas pela mineradora Samarco, responsável pelo desastre e controlada pela Vale a anglo-australiana BHP Billiton.
Se o PLS 654 for aprovado no plenário do Senado e depois na Câmara, teriam licenciamento acelerado obras complexas que também podem provocar tragédias e grandes impactos socioambientais, justamente aquelas que especialistas e ambientalistas consideram que necessitam de estudos e autorizações mais cautelosos e eficazes. Entre essas obras, estão hidrelétricas, estradas, hidrovias, portos, linhas de transmissão e comunicação.
O prazo estipulado pelo projeto torna inviável as análises de impactos ambientais com a profundidade e segurança necessárias, aumentando os riscos inerentes às grandes obras. Além disso, a proposta não prevê a realização de audiências públicas, quando comunidades atingidas por esses empreendimentos têm a oportunidade de conhecer suas consequências e apresentar reivindicações. O resultado é que, se transformada em lei, a proposta deverá estimular conflitos socioambientais e ações na justiça.
O PLS 654 propõe que, caso algum órgão público consultado a respeito do licenciamento não se pronuncie nos prazos definidos, será considerado que ele dá seu aval ao empreendimento. A medida permitirá que obras inviáveis do ponto de vista socioambiental sejam autorizadas.
“Esse rito que se tenta estabelecer potencializa os impactos. Vale dizer também que o PLS desconsidera a situação das autarquias do Estado. A Funai (Fundação Nacional do Índio) não tem contingente, o Ifam (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas) também não… E isso se associa ao fato do governo estar contingenciando recursos, que não se esforça para fortalecer suas autarquias. É um contrasenso”, defende Danicley de Aguiar, da campanha de Amazônia do Greenpeace Brasil.
O prazo médio para processos de licenciamento de grandes obras nos EUA é de 4,6 anos e, na Austrália, de 2,4 anos. Isso porque os dois países têm legislações ambientais muito menos rigorosas do que a do Brasil. As informações são do professor Luis Enrique Sánchez, da Escola Politécnica da USP.
O PLS foi discutido no Senado em apenas uma comissão, sem que os segmentos da sociedade fossem ouvidos. O governo é favorável ao projeto, segundo o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, informou à imprensa. O autor do PLS é o senador do Romero Jucá (PMDB-RR) e a proposta faz parte da “Agenda Brasil”, conjunto de projetos propostos pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para supostamente combater a crise econômica.
O Ministério Público Federal (MPF) já elaborou um parecer que aponta inconstitucionalidade do PLS 654, assim como um manifesto contra o projeto foi assinado por 135 organizações da sociedade civil e movimentos sociais. A Associação Brasileira de Avalição de Impacto Ambiental (ABAI) também elaborou uma nota contrária à proposta.
Belo Monte e Tapajós
O principal objetivo do projeto é facilitar a construção de grandes hidrelétricas na Amazônia, em especial na Bacia do Tapajós, onde há forte resistência de comunidades indígenas e ambientalistas contra a esses projetos. O povo Munduruku, por exemplo, que habita a região, nunca foi consultado pelo governo sobre a construção da Usina Hidrelétrica de São Luiz do Tapajós – isso porque a consulta está prevista em lei. Com a aprovação do PLS, a falta de transparência com as comunidades afetadas pela obra se tornará legítima.
Outro exemplo famoso de como as pressões políticas sobre o licenciamento ambiental podem resultar em consequências danosas para o meio ambiente e populações afetadas é a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. No fim de novembro, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) concedeu a Licença de Operação da usina sem que tivessem sido executadas condicionantes fundamentais para mitigar os impactos empreendimento e que deveriam ter sido cumpridas antes mesmo da implantação do canteiro de obras.
A cidade de Altamira, também no Pará, continua sem saneamento básico funcionando, o que deverá agravar as condições sanitárias com o enchimento do reservatório. Invasões e desmatamento aumentaram nas Terras Indígenas e Unidades de Conservação, sem que planos de fiscalização tenham sido implementados, entre outros problemas.
Pressione o seu senador a votar contra o PLS 654! (Greenpeace Brasil/ #Envolverde)
* Publicado originalmente no site Greenpeace Brasil

Brasil precisa de nova governança para bater meta ambiental

São Paulo - O governo brasileiro comemorou neste sábado (12) o fechamento de um acordo climático mundial na Conferência Mundial do Clima, a COP 21 , em Paris.
O texto foi aprovado pelos 195 países participantes da conferência, com o principal objetivo de aliar o desenvolvimento com a redução dasemissões de carbono para mitigar os efeitos do aquecimento global.
O impasse, porém, para aplicar as medidas propostas por aqui está em aliar interesses de diferentes áreas nesse bem comum.
Nas negociações em conferências, os ministérios de Relações Exteriores e Meio Ambiente vão atuando, super proativos. Mas quando falamos da implementação dessas medidas anunciadas, depende de uma série de outros ministérios, como Minas e Energia ou Agricultura, que tem ideais de aumento de produção , afirma em entrevista a EXAME.com a presidente do Comitê Científico do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas e coordenadora do Fundo Verde da UFRJ, Suzana Kahn.
Para Suzana, que foi a Paris para acompanhar a COP 21 como assessora, só uma convergência desses interesses poderá fazer com que o Brasil atinja sua meta proposta na conferência climática deste ano.
Ela comenta ainda sobre efeitos práticos para o brasileiro do acordo e o que ainda deve ser feito nas políticas internas para que o país atinja sua proposta apresentada.
Veja a conversa abaixo.
EXAME.com - O que acha que a conferência pode trazer de efetivo para o planejamento ambiental do planeta?
Suzana Kahn - A COP 21 vem sendo muito positiva, até porque eu não tinha muita expectativa. O mais importante, talvez, é que vem marcando um ponto de não-retorno . É a primeira vez que um acordo atinge todos os países. O acordo mundial, mesmo sem metas quantificadas, tem todos os reais problemas contidos no texto. Fala-se de medidas de descarbonização da produção de energia, da compensação aos países que emitem menos gases estufa, mas são os mais afetados, medidas gerais de mitigação, a necessidade de revisão periódica para regular níveis de emissão...
A direção está dada, a questão agora é a que velocidade será perseguida. O fato da conferência ter atrasado mostra uma preocupação real em um acordo robusto. Há uma expectativa boa com os resultados.
E para o Brasil? O que vê de evolução?
O Brasil foi o primeiro emergente que apresentou sua INDC [sigla para Contribuições Nacionalmente Determinadas Pretendidas, documento com as metas de redução de emissões de gases estufa que cada país pretende realizar para conseguir um acordo climático global].
Apesar de eu considerar uma proposta tímida para potencial do Brasil, foi a única que colocou não só uma meta que envolve toda a economia brasileira, como uma meta absoluta de redução. Boa parte dos países apresenta uma meta relativa ao crescimento, ao PIB, etc.
O Brasil sempre teve uma preocupação de fazer a ponte entre emergentes e desenvolvidos. Dessa vez, entrou até no grupo de Grande Ambição , que liderado pelas Ilhas Marshall fará pressão por um aumento de metas de redução. Isso é um ótimo sinal da disposição que o país trará para mudanças internas.
Sobre essa postura em conferências: essa proatividade do Brasil não se mostra tão clara nas ações reais dentro do país para achar matrizes energéticas e descarbonização da produção. Há mesmo diferença?
O que acontece é que as vontades e intenções esbarram muito na governança interna do país. Nas negociações em conferências, os ministérios de Relações Exteriores e Meio Ambiente vão atuando, super proativos. Mas quando falamos da implementação dessas medidas anunciadas, depende de uma série de outros ministérios, como Minas e Energia ou Agricultura, que tem ideais de aumento de produção.
Não pode ter esse antagonismo, todos têm que seguir a mesma filosofia. Nossa INDC deveria ser base de um planejamento de médio e longo prazo, algo que não temos. Fica a impressão de que cada um atira para um lado e os resultados acabam sendo ruins.
Há algum aspecto de agressão ambiental que tenha ficado de fora do radar dos governantes em nossa INDC? Algo que deveríamos estar prestando mais atenção?
Um tópico que acho muito tímido é a eficiência energética. Nossa meta é de aumento de 10%, isso é nada. O Brasil é o 14º no ranking de 15 grandes potências em eficiência energética, perdendo só do México. Mais eficiência é algo que traria um enorme ganho ao país, tanto em termos de custo, quanto para o sentido de aliar desenvolvimento e redução de emissões. Se a gente quer descarbonizar nossa economia, precisamos colocar investimento nisso.
Devemos temer que essas promessas não saiam do papel?
Estamos em um cenário diferente, em especial pelo avanço da ciência. Não existe mais aquele ceticismo de que o aquecimento global não existe. Há o reconhecimento que são efeitos da atividade do homem, do custo que isso significa, dos danos mais próximos das nossas gerações...
Por isso, nunca se investiu tanto em combustíveis renováveis, em termos absolutos e percentuais. Aqui mesmo, já temos um engajamento enorme das empresas, que colocam a emissão de carbono na própria cadeia de valor e estão preocupadas com a sua reputação nesse sentido.
A tecnologia de produção de energia renovável está mais barata. A energia eólica já é competitiva em partes do Brasil. Isso tudo faz com que estejamos indo para uma nova trajetória.
Que países mudaram mais de postura nessa COP21?
Estados Unidos e China mudaram bastante, mas a China ainda trava muita coisa. Os Estados Unidos, daquele país da época do Protocolo de Kyoto para agora, estão muito mais positivos. Isso já se notava por parte dos norte-americanos com acordos bilaterais de prevenção e redução de carbono, então, os Estados Unidos mudaram bastante, o que é fundamental para o resto do mundo.
Fonte : EXAME-ON-LINE

COP21: Sucesso histórico ou fracasso velado?

Por Ana Carolina Amaral, de Paris, especial para a Envolverde –
Os detalhes do acordo que tentou salvar o mundo no fim de semana.
Sem definir compromissos claros ou assegurar uma meta que garanta um futuro seguro para o clima, o Acordo de Paris, adotado na noite do último sábado pelos 195 países membros da ONU, é um sucesso histórico pelo consenso conseguido entre todas as nações sobre a importância e a urgência de se agir contra as mudanças climáticas provocadas pelo homem. É a primeira vez que uma Conferência das Partes da ONU sobre o Clima não deixa espaço para os negacionistas das mudanças climáticas; contorna os dificultadores e acomoda interesses conflitantes em um único texto. Até nas suas fragilidades, como as metas voluntárias em vez de legalmente obrigatórias, o acordo faz História e pode iluminar novos rumos: para o clima e para a diplomacia.
Em entrevista exclusiva após a plenária final que adotou o acordo, o presidente da Conferência e ministro de relações exteriores da França, Laurent Fabius, revelou ter estudado o processo da COP-15, em Copenhague – considerada um fracasso, em 2009, por não ter conseguido consenso em torno de um documento, que começaria a valer agora em substituição ao protocolo de Quioto. “Nós procuramos identificar as razões pelas quais houve uma série de falhas em Copenhague. Foi daí que eu e o presidente da França decidimos fazer desse modo agora.”
Como eles conseguiram
Entre os pontos da condução francesa que viabilizaram o acordo, Fabius destaca a inversão de estratégia no convite aos líderes nacionais. “Nós decidimos trazer os Chefes de Estado e de governo primeiro para dar um impulso político. E foi muito importante, porque todos eles disseram: ‘você tem que entregar’. E isso deu um mandato para as pessoas [os negociadores]. Enquanto em Copenhague, os presidentes vieram no final e, infelizmente, não podiam fazer nada se as coisas não estavam prontas.”
Assim como a presença dos Chefes de Estado na estreia, em que todos afirmaram sua vontade de chegar a um acordo pelo clima, outra novidade que criou ambiente para as negociações foi o convite para que os países apresentassem, ao longo do ano, suas metas voluntárias para redução de emissões. Vista como um sinal de respeito às soberanias nacionais, a criação do INDC (Contribuições Pretendidas Nacionalmente Determinadas) encorajou a proatividade dos países e fez com que a Conferência começasse, em 30 de novembro, com meio caminho andado: 186 países já tinham apresentado suas contribuições, com resultados que representam, se implementados, 50% do esforço necessário para evitar uma elevação da temperatura em níveis destrutivos. O Brasil foi elogiado pelas metas de combate ao desmatamento ilegal e redução de 37% das emissões na próxima década. Estados Unidos e China, os dois maiores emissores do mundo, surpreenderam ao anunciar juntos seus cortes de emissões.
Ao final da primeira semana de negociação, o texto tinha reduzido suas indefinições pela metade. Para resolver o restante, Fabius formou quatro grupos de trabalho, cada um facilitado por uma dupla de ministros, para avançar nos principais nós do documento: implementação e financiamento, nível de ambição, diferenciação de responsabilidades e aceleração das ações entre 2015 e 2020. Se os grupos não tiraram da cartola respostas mágicas para acomodar interesses conflitantes entre os países envolvidos, ao menos encontraram saídas para viabilizar uma mensagem conjunta.
O documento
A meta do Acordo de Paris é o que torna o documento ambicioso e fraco ao mesmo tempo. Ambicioso, porque se compromete com um limite entre 2°C e 1,5°C no aumento da temperatura global. Fraco, porque não traz compromissos que reflitam a meta. Segundo Suzana Kahn, cientista brasileira que integra o o IPCC (painel científico da ONU para mudanças climáticas), “é extremamente improvável que fiquemos no cenário mais seguro, de 1,5°C, sendo que a humanidade já aqueceu 1°C desde o começo da era industrial. Até mesmo 2°C é ambicioso e vai exigir esforços tremendos.”
Um dia antes do acordo ser assinado, cientistas do IPCC reclamaram que o texto era incoerente, pois não mostrava um plano para alcançar essa meta ambiciosa de temperatura. Para contar com a assinatura de todos os países, o documento se manteve genérico: não cita prazos, nem metas comuns para que as emissões de gases-estufa comecem a cair. Isso deve acontecer apenas via contribuições nacionalmente determinadas e, segundo o texto, “o mais breve possível”.
Durante as negociações, organizações como o Observatório do Clima e a Avaaz cobraram um compromisso com a descarbonização da economia até 2050. Ou seja, para viabilizar o teto de aumento entre 2°C e 1,5°C, os investimentos deveriam migrar nas próximas décadas das fontes fósseis para as renováveis. Em vez de descarbonização, no entanto, o documento final estipula para 2050 a “neutralização das emissões”, o que valida a continuidade de emissões desde que elas sejam compensadas, com a estocagem de carbono.
Embora algumas ONGs, a exemplo da Biofuelwatch, tenham se preocupado com a abertura que essa linguagem pode representar para empresas do ramo dos combustíveis fósseis oferecerem tecnologias de captura e estocagem do carbono no subsolo (CCS) – caras, inseguras e questionadas pelos cientistas do clima; o documento aposta é na estocagem natural de carbono, através da restauração florestal.
Para isso, dois mecanismos defendidos pelo Brasil são descritos no texto: o REDD+, programa que remunera os países por reduzirem suas emissões evitando o desmatamento e a degradação florestal, e um novo mecanismo de mercado para comércio de carbono – a exemplo do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo criado para o Protocolo de Quioto – que não estava proposto no primeiro rascunho de Paris e foi trazido à mesa pelo Brasil, em conjunto com a União Europeia, nessa última semana. Juntos, os dois mecanismos ajudam a implementar a meta de neutralização das emissões até a primeira metade do século, apoiando financeiramente países em desenvolvimento e detentores de grandes áreas florestais.
Os dois pontos em que os compromissos mais avançaram foram a revisão das metas nacionais a cada cinco anos e a transparência na prestação de contas da redução de emissões, através de um sistema único que garanta métricas equivalentes entre os diversos países. No entanto, a questão do financiamento, considerado o principal nó do acordo porque implica uma definição sobre as diferentes responsabilidades, ficou fragilizada.
Houve aceitação geral de que o investimento financeiro deve se dividir equilibradamente para apoiar ambos os processos de mitigação e de adaptação às mudanças climáticas nos países em desenvolvimento. Porém, sem o entendimento sobre o financiamento de longo prazo, decidiu-se postegar para até 2025 o aporte de 100 bilhões de dólares anuais com que os países desenvolvidos já tinham se comprometido na COP-15, em 2009, previsto na época para durar de 2015 a 2020. O problema é que o documento não sugere que esse valor seja aumentado no fim do período, nem esclarece o que acontecerá depois. E os diversos estudos sobre os impactos do aquecimento global apontam em uníssono que esse montante é insuficiente: o mundo precisaria se preparar para custos climáticos na ordem dos trilhões.
Para começar a resolver a disputa clássica das COPs do Clima sobre as diferenciação de responsabilidades, mais uma proposta brasileira foi contemplada: a progressão do nível de responsabilidades, respeitando as diferenças históricas e capacidades atuais dos países em desenvolvimento, mas caminhando para uma convergência nos níveis de comprometimento. Com isso, tende a aumentar a participação das economias emergentes, como o Brasil, no pagamento da conta do clima.
Por fim, os mais prejudicados são mesmo os países mais vulneráveis, especialmente as ilhas. Ameaçadas de ficarem submersas em um mundo que esquente mais de 1,5°C, elas pareciam ter conseguido que o documento “não deixe ninguém para trás”, com a citação de um esforço para chegar ao aumento máximo de 1,5°C – o que rendeu à COP-21 o título de sucesso em ambição, ainda que os cientistas tenham deixado claro a improbabilidade da meta. No entanto, a menção ao limite de 1,5°C saiu cara aos pequenos países. No parágrafo que cita os cuidados para evitar e reparar as perdas e danos causadas pelas mudanças climáticas, há a citação clara, no artigo 52, de que isso “não envolve nem fornece uma base para qualquer responsabilidade ou compensação”. Isso quer dizer que os países desenvolvidos, responsáveis historicamente pelas emissões que aquecem o planeta, eximem-se de financiar a recuperação dos países mais vulneráveis, que já estão sendo prejudicados por eventos climáticos extremos.
Reações na plenária final
A Nicarágua foi o único país que reclamou, entre as declarações que seguiram a adoção do acordo. Seu negociador-chefe, Paul Oquist, exigiu a eliminação do artigo 52, que exime as responsabilidades sobre perdas e danos. Ele lembrou que as metas nacionais apresentadas neste ano levam a um cenário de 3°C e, portanto, não são suficientes para cumprir o objetivo de limitar o aquecimento a 1,5°C. “Não podemos mandar nossos netos a um cenário de mais 3°C e eliminar, já em 2015, seu direito a pedir compensação pelas suas perdas”, arrematou.
Países como Arábia Saudita, Rússia e Venezuela, cujos discursos ainda causam apreensão pelas vezes em que já dificultaram o acordo, dessa vez seguiram a linha dos demais: comemoraram o resultado e elogiaram a condução do processo. Ainda na plenária final, mais três países anunciaram suas INDCs: Ilha de São Cristóvão, Venezuela e Palestina, que é hoje um país observador no sistema da ONU. “Repetimos muitas vezes nessa negociação que ninguém pode ser deixado para trás. E a Palestina não pode ser deixada para trás”, declarou, emocionado, o embaixador Riyad Mansour, quando a plenária final já passava da meia-noite.
“Esta foi a última vez que a Palestina fala por último apenas como um estado observador”, ele prometeu, comprometendo-se com os esforços pela paz e pelo clima. O negociador brasileiro Raphael Azeredo, satisfeito com um acordo que reflete as posições defendidas pelo Brasil, declarou que o país “continua pensando que o multilateralismo é a melhor forma de resolver nossos problemas comuns”.
Momentum
Anfitriões de revoluções históricas, os franceses sabem como criar um “momentum” – ou melhor, um clima. Isso foi visto ao longo do ano e nos 15 dias de COP-21. Aliás, “momentum for change” foi o nome de uma das agendas paralelas às negociações que buscou mostrar as iniciativas locais e intersetoriais que já sinalizam uma transição inevitável para uma economia de baixo carbono. Com tudo isso, criou-se um ambiente de proatividade, sob a mensagem de que a mudança já está em curso.
As metas são diversas, voluntárias e é factível que simplesmente não sejam implementadas. Mas aí não faltam lembretes de que o Protocolo de Quioto, mesmo sob força de lei, também não foi cumprido. Um acordo que não obriga ninguém a nada é uma prova de que os líderes globais são mesmo apenas aquilo que lhes delegamos: representantes.
Se não houvesse acordo, é provável que sairíamos de Paris falando que os anúncios voluntários de desinvestimento em fósseis já representam o fim da era do carbono. Não é o acordo, portanto, que significa essa mudança de era: é o momento em si. E ele se constrói pelos atores locais: prefeituras, governos, empresas, organizações da sociedade civil e, em especial, coalizões que combinam esses setores somando esforços locais a internacionais.
Não é à toa que até as organizações mais críticas reconheceram o documento como um sucesso: ele também mostra uma mudança de expectativa em relação ao papel dos líderes mundiais, que apenas representam em escala global o que o mundo dos representados localmente constrói. A sociedade global está se reinventando e não cabia mais na História um fracasso que ignorasse essa virada de rumo.
O Acordo de Paris, longe de ser o salvador do mundo, é o salvador da diplomacia. Ele inverteu processos, prioridades e o que era sua maior fraqueza para encontrar uma lei comum aos 195 países – dada a diversidade de condições e cenários -, gerou uma novidade: a aposta na proatividade das metas voluntárias, com respeito à soberania dos países e suas diferentes capacidades. É digno da qualificação de “sucesso histórico” em tempos de um multilateralismo ameaçado pela sua própria reputação.
Já para as mudanças climáticas, o acordo só poderá ser julgado pelo seu sucesso em 2050, se alcançar a neutralização das emissões. É histórico, simplesmente, por conta do consenso inédito. De resto, não traz compromissos suficientes, nem garantias. Mas traz, sim, o necessário reconhecimento global de que a Ciência estava certa e de que cabe a todos nós, representantes e representados, fazer valer essa transição. Sem detalhar a rota, o Acordo de Paris ilumina um rumo. (#Envolverde)
*Ana Carolina Amaral é jornalista formada pela Unesp, mestra em Ciências Holísticas pelo Schumacher College (UK) e moderadora da Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental.

Zoneamento da BR-163 contribui para legalidade ambiental na Amazônia, diz Minc

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, afirmou na quarta-feira (11) que o zoneamento econômico e ecológico da BR-163 ajuda a constituir o que se referiu como “a linha da legalidade ambiental da Amazônia”. A rodovia tem cerca de 1,8 mil quilômetros de extensão e interliga os estados do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina, do Paraná, de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e do Pará.Ao participar de reunião do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), ele avaliou que a estratégia representa “um bom plano” uma vez que não prevê a expansão da pecuária ou do desmatamento, mas a recuperação de áreas já degradas. “O zoneamento defende o que pode ser feito, como e onde.”Minc lembrou que a contratação de mil fiscais ambientais para a Amazônia não vai depender de lei alguma, porque os cargos já haviam sido aprovados, mas não ocupados. Ele criticou o fato de que algumas unidades de conservação cheguem a apresentar 1 milhão de hectare e apenas dois fiscais e garantiu que a combinação do zoneamento com a regularização fundiária na região irá levar à queda do desmatamento.“Quando invadem, as pessoas não pagam a terra, não assinam carteira, não pagam multa e têm sempre um político para defender. Para recuperar uma área degradada, é complicadíssimo, não há lei, norma ou incentivo. A gente tem que inverter essa situação, tornar mais difícil invadir as áreas virgens e mais simples e econômico recuperar áreas degradadas.”Minc voltou a afirmar que a conclusão do zoneamento econômico e ecológico da Amazônia sai ainda este ano. Para o diretor do Conama, Nilo Diniz, a medida representa “peça fundamental” de planejamento e ocupação do território com foco na sustentabilidade social e ambiental.Ele avaliou que o zoneamento é “consenso” entre governo, sociedade civil e órgãos municipais e estaduais, sobretudo quando se trata de áreas de alta ocupação. “Para que se defina os limites desse uso e a necessidade de recomposição de reservas”. (Fonte: Paula Laboissière/ Agência Brasil)